Além do Aedes Aegypti,
há outra praga que assola o Brasil: a mania de meter nos nomes
próprios termos como Kaiowá, Guarani-Kaiowá etc etc.
Ainda bem que o
fenômeno se restringe – até onde sei – ao Facebook.
Um curioso trabalho do
historiador Helio Vianna (1.908-1.972), publicado no Jornal do
Comércio, do Rio de Janeiro, a 23/11/1962, dá inúmeros exemplos de
algo semelhante acontecido logo após a independência do Brasil,
anos 1822 a 1824.
Muitos brasileiros
abandonaram seus sobrenomes de origem lusitana para adotar outros
pretensamente “nativos”.
Alguns exemplos:
No Rio de Janeiro:
“Além dos nomes,
hoje diríamos nacionalistas, que publicamente se adotaram, outros
permaneceram secretos na Maçonaria e na carbonária Nobre Ordem dos
Cavaleiros da Santa Cruz, o Apostolado carioca de 1822/1823. Assim,
se naquela foi o Príncipe Regente, depois Imperador D. Pedro I,
astecamente cognominado Goutimozim (sic), na segunda coube essa
designação indo-mexicana (Guatimosin) ao Ministro da Fazenda,
Martim Francisco Ribeiro de Andrada.
Seus irmãos, José
Bonifácio de Andrada e Silva, “Cônsul” do Apostolado, e Antônio
Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva, “Apóstolo”, foram,
brasílica e britanicamente, Teberiça (sic) e Falkland,
respectivamente. D. Pedro, “Arconte-rei”, romanamente começou
como Rêmolo, nome logo corrigido para Rômulo.”
Na Bahia:
“No jornal O
Independente Constitucional, a partir de 1º de março de 1823
publicado na vila da Cachoeira, redigido pelo famoso bacharel
Francisco Gomes Brandão Montezuma, futuro senador do Império e
Visconde de Jequitinhonha, registraram-se aquelas mudanças de nomes.
(…) seu próprio redator declarou que dali por diante seria seu
nome Francisco Gê Acaiaba de Montezuma, curiosa aproximação do
prenome português a sobrenomes respectivamente tapuia, tupi e
asteca. (…)
(…) Manuel José
Milagres, transformado em Manuel José Olandim.
(…) Sobrenomes
idênticos a nomes de cidades portuguesas foram especialmente
rejeitados pelos nacionalistas baianos de 1823.
(…) Manuel da Silva e
Sousa Coimbra passou a Manuel da Silva Caraí; Inácio Joaquim
Pitombo Lisboa abandonou a lembrança da capital lusitana; outro
Lisboa passou a Antônio Cosme Baiense, José Luís Valença trocou-a
por Baitinga. (…)
“Até portadores de
antigos e fidalgos sobrenomes, vindos do século XVI, trocaram-nos
por outros, aparentemente mais brasileiros. Foi o que aconteceu a
José Garcia Cavalcanti de Albuquerque Aragão, que passou a ser José
Cavalcanti d'Caramuru (sic) Imbiara. Ou Francisco da Cunha Nabuco de
Araújo, transformado em Francisco Cambuí de Itapagipe. (…) Não
ficaria esquecido o rio Paraguaçu, por José Pedro Alexandrino de
Morais, depois José Pedro Paraguaçu. Topônimo mais longínquo
adotou Caetano Pascoal dos Santos, transformado em Caetano de Araújo
Mato Grosso. (…)
Reminiscência africana
apareceu no novo nome do Padre Manuel José de Freitas, Manuel Dendê
Bus. (…) “
E muito mais em
Pernambuco e Ceará revolucionários de 1824, a confirmar a suspeita
de que o festival de besteiras que assola o Brasil tem raízes
antigas.
(trechos extraídos de
Helio Vianna, Vultos do Império, Companhia Editora Nacional, 1968)