quinta-feira, 5 de agosto de 2004

Era uma vez - III
As Origens



A esquerda brasileira, no século XX, tem, basicamente, três origens:
O Partido Comunista Brasileiro (“Partidão”, para os íntimos), de orientação soviética, criado em 1.922;
Setores da Igreja Católica comprometidos com uma certa “visão social” da Igreja e estruturados em JECs, JOCs e JUCs (Juventude Estudantil/Operária/Universitária Católica) e na Ação Popular (AP);
Segmentos trotskistas situados, fundamentalmente, nas Universidades. Alguns desses segmentos seguiam a orientação da chamada 4ª Internacional, cujo braço latino-americano era conduzido por um trotskista folclórico – o argentino Homero Cristali, conhecido pela alcunha de J. Posadas. Outros simplesmente tinham um vínculo conceitual com o trotskismo. Um deles estruturou-se como Organização Revolucionária Marxista (ORM), mais conhecida pela corruptela do nome de seu jornal (vendido em banca até o golpe de 64) – Política Operária. Foi a POLOP.

Do Partidão surgiu a dissidência do PC do B (Partido Comunista do Brasil) por ocasião da denúncia dos crimes de Stalin por Kruschev (1.956). De orientação chinesa, tentou desenvolver a luta armada no campo, já nos anos setenta, implantando um foco guerrilheiro no Araguaia.
Do mesmo Partidão, surgiram outras dissidências, na década de sessenta. Talvez a mais importante tenha sido a Aliança Libertadora Nacional (ALN), criada por Carlos Marighela, um dirigente do Partidão que se exasperou com a relutância do Partidão em partir para a luta armada.
Penso que é dos anos sessenta a utilização da expressão Esquerda Revolucionária como referência aos grupos que defendiam a luta armada, em oposição ao Partidão, tido como meramente reformista.
Do PC do B, surgiram dissidências tais como a Ala Vermelha (para os íntimos, “Ala”).

Da POLOP surgiram o POC (Partido Operário Comunista), que aglutinou uma dissidência gaúcha do Partidão; a VAR-Palmares, que misturava a POLOP com a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária) do ex-capitão Lamarca.

Uma montanha de grupelhos surgiu nos anos setenta, mas as origens são – muito resumidamente – as que citei acima. De resto, esse resumo que fiz só pretende facilitar a compreensão de algumas histórias que vou contar aqui.

Já a repressão, no início dos anos setenta, classificava todos esses grupos em duas grandes categorias: os subversivos e os terroristas. De acordo com o que alguns torturadores faziam questão de explicitar, eram subversivos os grupos que não haviam aderido à luta armada e não praticavam as chamadas “ações” (assaltos a banco, supermercados etc). Basicamente, o Partidão, os trotskistas da IV Internacional e outros poucos. Os terroristas eram, claro, os que praticavam “ações” e preparavam-se para desencadear a luta armada (ALN, VPR e um número grande de pequenos grupos).

Um certo dia, na Oban (Operação Bandeirantes) um torturador explicou-me, didaticamente, a mim, que era membro do POC, o porque de eles considerarem que tinha sido muito bom, para nós (do POC), sermos presos. Eles haviam chegado à conclusão de que estávamos à beira de ingressar no rol das organizações terroristas. Por termos sido presos, ficamos no limiar do que eles consideravam subversivos. Em síntese, não nos pretendiam mortos.

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