quarta-feira, 23 de junho de 2004

O que o ser humano não uniu,
Deus nem tente


No meio daquele frio danado, ela chegou. O apartamento era ainda novo, as paredes, dizem, demoram a secar. Faz mais frio em apartamento novo. O fato é que estava gelado. Ela entrou, aquele sorriso enorme, moreno, embrulhada por um enorme casaco.
Marina era um papo pra lá de bom. Divertida, amiga, sarcasmo na medida, carinho na dose certa.
Hoje estava um pouco séria. Fora do habitual, foi logo dizendo: tem que ser com você. É importante. Eu escolhi você.
- Mas Marina. Você não sabe o que está dizendo. Você pensou bem?
Claro que pensei (ela já meio sem paciência). Você é o cara mais bacana que já conheci. Eu tenho que perder a. Você sabe, não dá mais pra ficar assim. Tenho quase vinte anos. Você me inspira confiança. Eu quero.
- Mas, caramba, isso não é assim. Sem mais aquela. Ainda por cima você acabou de ser operada. É até arriscado. Sei lá.
Você não vai dizer que não quer, né. Você não gosta de mim?
- Marina, eu te adoro. Mas.
Então.
Foi quase ridículo, não fosse Marina a coisa mais fofa do mundo. Ele, também, era de uma inexperiência quase total, imperdoável. Foi um puxar casaco pra cá, cobertor pra lá. Cuidado com os pontos!
Depois foi aconchego, tranqüilidade. Com Marina era sempre assim, gostoso de conviver.
Mais tarde, no tempo que se seguiu, as coisas não se encaixaram. Surgiu Elen, Marina não entendeu. Pudera, ninguém entenderia, ninguém entendeu.
Outras vezes, no futuro mais distante, reencontrou Marina. Sempre o sorriso farto, um pouco cansado talvez.
Não sei como é o nome da saudade do que não houve.
Se soubesse diria agora. Como não sei, fica o nome de Marina.

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