domingo, 8 de outubro de 2006
O professor Figueiredo
1968. Eu dava aulas no CAPI – cursinho preparatório para vestibulares.
Toda noite, depois das aulas, lá pelas 11 e meia, nós, os professores (quase todos) e o Farina, diretor, íamos para algum restaurante, jantar. Quase sempre no Largo do Arouche ou na Maria Antonia.
O detalhe de que às 7 da matina (às vezes às 6) eu já deveria estar novamente dando aula não impedia que ficássemos conversando e bebendo até duas, três da madrugada. Quase todo dia. Juventude serve pra isso.
Discutia-se política, falava-se de costumes, fazia-se muita piada com quase tudo.
Entre os professores que não participavam da turma, havia um de Matemática, o professor Figueiredo. Mais velho que todos nós, andava sempre de terno e ninguém sabia ao certo de onde ele surgira.
Um dia, na saída para o jantar, perguntamos se ele não queria ir conosco. Sujeito calado, pouca conversa, simplesmente aquiesceu.
Íamos à pé pelas ruas do centro de São Paulo, como sempre.
A certa altura ele perguntou aonde iríamos.
Por gentileza, alguém perguntou se ele tinha alguma sugestão de lugar.
Surpresa: ele tinha sugestão.
Seguimos o professor Figueiredo.
Levou-nos até a Galeria Metrópole, Avenida São Luis.
Sem hesitar, entrou em uma boate cheia de mulheres à espera de fregueses.
Nós outros, em fila indiana, constrangidos, agradecíamos a pouca luz do ambiente, que pelo menos nos resguardava do que considerávamos um vexame. Fomos entrando.
No pequeno palco, um grupo musical, sanfonas e coisas assim, distraía a pequena platéia com baiões, xotes e xaxados.
De repente, mais surpresa.
O grupo musical pára de tocar. O líder do conjunto fala ao microfone:
- Estamos recebendo com enorme prazer
PROFESSOR FIGUEIREDO E SEUS AMIGOS!!!!!!
E o discreto dito cujo, despindo abruptamente seu caráter reservado, responde com seu grito de guerra:
SEGUUUURA, BAITOLA!!!
Todos nos perguntávamos por que – nessas horas – a Terra não se abre, acolhedora.
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