domingo, 3 de setembro de 2006

O dia em que ouvi o silêncio


Em 1.974, fui convidado pra dar um curso maluco de Fundamentos da Matemática na Faculdade de Ciências e Letras de Lins, interior de São Paulo.
O curso era nos finais de semana. Eu pegava um ônibus noturno na sexta. Chegava em Lins por volta das cinco da manhã do sábado. Dava tempo de dormir, na cama do quarto do hotel, até lá pelas sete porque as aulas começavam às oito (e iam até o final da tarde. Pobres alunos).
Eu me hospedava no Hotel Lins, bem na praça principal da cidade. Era uma praça toda arborizada. Quando amanhecia o dia, milhares (quase ia dizendo milhões) de pássaros começavam a cantar sem maestro (ou com Maestro, se você acredita n’Ele). Era deslumbrante.
Mas às cinco da manhã, quando eu chegava ao hotel, todos dormiam.
Foi na minha primeira ida.
O ônibus parava em frente a uma casa na qual funcionava a empresa de transporte. Desci e perguntei ao funcionário como devia fazer pra chegar ao hotel. Era muito fácil. Só dobrar a primeira à esquerda e seguir aquela rua por algumas quadras. Ela desembocava na praça do hotel.
Eu e minha pequena mala, com poucas roupas e alguns livros, seguimos a indicação.
Depois de caminhar umas duas quadras, fui tomado por uma sensação estranha. Parei. E foi aí que percebi a origem do meu estranhamento.
Não se ouvia rigorosamente nada.
Som de gente, som de automóveis, caminhões. Ônibus, trens. Som de animais. Som de vento. Som de chuva. Nada.
Me dei conta de que, beirando os trinta anos, era a primeira vez que me encontrava rodeado de silêncio absoluto.
Fiquei parado, ali, alguns minutos.
Admirando o silêncio.
Percebi, também, naquele instante, que jamais me esqueceria daquela sensação.

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