sábado, 11 de dezembro de 2004

Como aprender a ser português em algumas lições


Desde que chegamos a Viana do Castelo não paramos de aprender coisas interessantes. Por exemplo: percebi que o carro estava com quase nada de óleo no motor. Fomos a uma concessionária Peugeot. Confirmou-se o que já havíamos reparado em lojas, restaurantes etc. Quase sempre há apenas um funcionário a atender ao público. Espera-se muito, portanto. Quando se é atendido, tratamento de rei (nem que seja para informar que o produto não existe, que o serviço não está disponível etc etc).
Veja-se o caso da oficina de veículos. Em São Paulo, chega-se com o carro a uma dessas oficinas (ditas "autorizadas"). Há sempre duas ou três mocinhas bonitinhas, atraentes e sorridentes para recebê-lo. Dão-lhe boas vindas e pedem que aguarde o atendente técnico. Em resumo, não fazem nada. A não ser agradar ao olhar. O técnico chega (há sempre vários deles por ali), faz perguntas, preenche uma enorme ficha e leva o carro lá pra dentro. Manda que telefone três ou quatro dias depois, para saber se o carro já está pronto.
Em Viana, entrei na oficina Peugeot. Havia lá um rapaz a atender outro cliente. Demorou uns quinze minutos até tomar conhecimento da minha existência. Disse que metesse o carro pra dentro da oficina (os portugueses usam o verbo "meter" com uma habitualidade surpreendente). Examinou o nível do óleo, disse que estava tudo em ordem no Universo, preencheu o reservatório com um pouco mais de óleo, desejou-me bons passeios e foi atender a um outro cliente que esperava pacientemente. Era o único ser vivo nas imediações.
E o telemóvel? Vida dura a de um brasileiro que adquire um telemóvel em Portugal. Primeiro, tem de aprender a não falar "celular". Depois, bom, depois há a questão do carregamento de créditos. Estamos hospedados lááá no alto do monte Santa Luzia. Como meus créditos do celular haviam terminado em meio a uma conversa técnica com um funcionário Vodafone que tentava explicar-me porque a placa pela qual paguei uma fortuna não funciona, lá fui ao centro comercial Estação Viana à busca de uma loja TMN para carregar mais créditos (comprei um celular TMN e uma placa para Internet da Vodafone. Percebi que essas empresas, cá em Portugal, são algo do tipo Benfica e F.C. do Porto. Como quero estar bem com todos...). Chego à loja, aguardo que a única funcionária existente (como já disse, é sempre assim)se livre do cliente anterior, e solicito um carregamento. E ela:
- Qual a referência? (na verdade, ela falou algo como "rifrênxia")
Olhei-a com cara de "I beg your pardon".
- A rifrênxia. Rifrênxia Multibanco.
????
- O senhor deve ter um número que lhe forneceram ao adquirir o telemóvel. É a referência Multibanco.
Lá vou eu, morro acima, buscar dois dígitos esquecidos no hotel.
Quanto à placa Vodafone, bem. Lembra um pouco a história do inferno brasileiro. Pra quem não sabe: sujeito chega ao inferno e é informado que pode escolher. Tem inferno suíço, inferno brasileiro etc etc.
Ele pergunta como é o suíço.
Olha, às terças e quintas come-se merda.
E no brasileiro?
Come-se merda todos os dias.
O indivíduo escolhe o suiço. Está a dirigir-se para lá, passa na frente do inferno brasileiro. Uma porção de gente a querer entrar.
- Mas por que todos querem o inferno brasileiro. Aí come-se merda todo santo dia. No suíço só terças e quintas.
Explica o guia: é que no suíço é inevitável comer-se merda às terças e quintas. No brasileiro, em tese, é todo dia. Mas num dia falta panela, no outro não tem prato, depois é a própria merda que falta...
Ao vir para Portugal, trouxe um "portátil" (é assim que se chama "notebook" aqui). Ao aqui chegar, comprei um telemóvel e a placa Vodafone para acessar (fala-se "aceder") a Internet. Adquiri também uma máquina fotográfica digital para entupir meu blog de fotos maravilhosas. Mas, como em todo bom inferno brasileiro, um dia é a placa que não funciona, em outro o portátil trava, volta e meia lá se vão os créditos de telemóvel e da placa etc etc etc. Ah. Já aconteceu de terminar a carga da bateria da máquina fotográfica no momento de uma linda foto.
Vamos em frente.

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