sexta-feira, 13 de junho de 2008
A falseta do padre Júlio Lancelotti
Faz algum tempo, o padre Júlio Lancelotti acusou um rapaz de tentativa de extorsão. A história era novelesca: envolvia possíveis relacionamentos sexuais do padre com o acusado, utilização de muita grana de uma ONG à qual o padre é ligado para comprar automóveis de luxo pro rapaz etc etc.
Como o padre é bem relacionado (seu advogado é o inefável Luiz Eduardo Greenhalgh, deputado pelo PT, ex-advogado de presos políticos (ah! essa turma!), ex-vice-prefeito de São Paulo, às voltas com histórias de suborno por parte da empresa Lubeca etc etc), o resultado líquido do imbróglio foi:
1. Decretaram segredo de justiça no processo;
2. Prenderam os acusados (o tal rapaz, sua mulher e dois irmãos envolvidos na acusação);
Agora, passados 7 meses, soltaram o rapaz, a mulher e os irmãos e caiu sobre o caso o mais ruidoso silêncio.
Vi uma discreta notícia na Folha de S.Paulo, dia 11, agora, quarta-feira. Um trecho dela:
Vinte quilos mais magro, Anderson Marcos Batista, 26, acusado pelo Ministério Público de ser o chefe da suposta quadrilha que teria extorquido dinheiro do padre Júlio Lancelotti, 59, foi solto ontem pela Justiça após sete meses preso.
"A Justiça mostrou que sou inocente", afirmou ele ao deixar o Centro de Detenção Provisória do Belém, na zona leste.
Além dele, sua mulher, Conceição Eletério, 44, também acusada, deixou ontem a Penitenciária Feminina do Estado.
"Estou revoltada. Ficamos presos sem nunca termos sido culpados", disse ela, que pretende estudar a possibilidade de entrar com uma ação indenizatória contra o Estado.
Anteontem, outros dois acusados, os irmãos Evandro, 29, e Everson Guimarães, 27, que estavam presos com Batista, já haviam sido soltos. Os quatro foram absolvidos pelo juiz Julio Caio Farto Salles, da 31ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça. Segundo o advogado Nelson Bernardo da Costa, seus clientes "foram absolvidos por insuficiência de provas".
No ano passado, o padre Júlio, que atua na Pastoral do Povo de Rua e é um dos principais defensores dos direitos de adolescentes infratores, procurou a Polícia Civil acusando Batista e os outros três por ameaças falsas de pedofilia. Procurado, o padre não quis falar. [...]
Assinante Folha ou UOL lê a íntegra da matéria aqui.
Não faltam, na imprensa, indignados defensores do tal padre. Só pra dar um exemplo, leia aqui o panegírico esculpido por um Walter Falceta Jr., merecedor do sobrenome que carrega, autor de um Guia Sexy de São Paulo. Aliás, espero que ele, em seu Guia, não tenha esquecido de incluir o padre entre as atrações do ramo na paulicéia desvairada.
Já pra cobrar uma mísera explicação quanto ao fato de deixarem presos cinco indivíduos durante 7 meses e depois soltá-los como quem vai às goiabas, só encontrei, na imprensa, a indignação de Barbara Gancia, aqui (para assinantes Folha ou UOL). Leiam dois trechos:
Quero saber se quem mentiu no caso do padre Júlio receberá o mesmo tratamento de quem disse a verdade
Não é possível saber os pormenores do julgamento, uma vez que o processo correu em segredo de Justiça. Mas ainda há algumas dúvidas antigas por esclarecer no caso do padre Júlio Lancelotti, famoso por defender os direitos dos adolescentes, que no ano passado acusou de extorsão o ex-interno da Febem, Anderson Marcos Batista, a mulher dele, Conceição Eletério, e os irmãos Evandro e Everson Guimarães.
Detidos desde outubro de 2007, o ex-interno, a mulher e os dois irmãos acabaram absolvidos e soltos.
[...]
Quero saber se a história fica por isso mesmo. Quero saber se quem mentiu neste caso receberá o mesmo tratamento de quem disse a verdade e, enxerida que sou, quero saber também de onde vieram os tais R$ 700 mil que o padre teria dado ao antigo protegido.
Eu também.
sábado, 7 de junho de 2008
Deus é fiel
(mas a Justiça, nos EUA, não quer saber disso)
A bispa Sonia, aquela que fala com voz de choro, foi solta hoje.
Mas ela e o maridinho apóstolo ainda têm de cumprir dois anos de liberdade vigiada, nos EUA.
No Brasil, o pessoal da igreja Renascer continua a acreditar que tudo não passa de armação do demônio.
Além da pergunta que o Zé Simão já fez em sua coluna na Folha de S.Paulo (por que a bispa Sonia não curou o joelho do Kaká?), resta o ridículo absoluto de todo esse imbróglio.
Mas se as pessoas preferem o engano, fazer o quê.
quarta-feira, 4 de junho de 2008
Que você fará com as cinzas de seu parceiro?
A cantora Courtney Love deu uma resposta fofa a essa pergunta: colocou (parte) das cinzas do marido - Kurt Cobain - em uma bolsa pink em forma de ursinho. A informação tornou-se pública porque parece que furtaram a tal bolsa.
sexta-feira, 30 de maio de 2008
quarta-feira, 28 de maio de 2008
Na cabeça
Os políticos, pelo menos no Brasil, são – cada vez mais – meliantes à procura da imunidade parlamentar. Parece ser bem melhor ser julgado pelo Supremo do que em primeira instância, por um juizinho qualquer. O trâmite é tão demorado que vale a pena, ops!, vale a não-pena.
Vai daí, lembrei-me de uma figura ímpar, que conheci em meados de 1.988. O obeso Moisés Lipnik.

Ele era filho de banqueiro de Miami. Parece que logo que alcançou a maioridade, o pai lhe deu uma grana e disse, a la Drummond:
- Vai Moisés. Vai ser gauche na vida.
E Moisés aportou no Brasil da ditadura militar, do general Golbery.
Contava ele que começou a – digamos – carreira intermediando um grupo de empresários japoneses que pretendiam estabelecer negócios no Brasil.
Vendeu a eles a idéia de que poderia obter entrevista com o general Golbery. Conseguiu marcar a audiência e lá foi ele, levando os japoneses a tiracolo.
Uma vez diante do general os japoneses expuseram suas pretensões e foram ouvidos com respeito, mas com distanciamento.
Ao saírem, Lipnik avisou aos japoneses que precisava retornar para entregar o cheque ao general. Cheque dos japoneses, claro. Voltou à sala do general, os japoneses olhando à distância, e entregou a Golbery um cartão de visita.
Manobrou, junto a assessores do general, para que os propósitos dos japoneses se realizassem.
Tudo deu certo. Ele, que dissera ter entregue o cheque ao general, ganhou seu primeiro milhão de dólares.
Não sei se esta história é fantasiosa ou não. Eu a ouvi do próprio Lipnik.
A questão é que, quando eu o conheci, ele já era podre de rico, casado com uma ex-miss Miami (meus amigos brincavam de adivinhar quanto ele teria pago por isso) e candidato a senador por Rondônia (ou terá sido Roraima?). Tanto faz. Ele nunca estivera em nenhum desses lugares.
Lipnik era virtuose do telefone. Isso no tempo do telefone de fio. Aboletava-se em uma cadeira do escritório em que eu trabalhava, agarrava o fone do telefone e começava a falar, sem parar. Segurava o fone com – digamos – a mão direita. Ao longo do diálogo, trocava de mão deslizando o fone ao longo de sua enorme barriga. Como dizem os locutores esportivos, o fone descrevia uma parábola e encaminhava-se à outra orelha do Lipnik. Isso não interrompia, de modo algum, a conversação. Ao contrário, parecia dar-lhe ritmo.
Vou já adiantando que Lipnik elegeu-se deputado federal (por Rondônia ou por Roraima?), nem sei por quantas vezes. Com isso, conseguiu empurrar com a barriga (e que barriga!) várias ações contra ele. Morreu ileso.
Mas, nessa época, no longínquo 1.988, ou 1.989, Lipnik era candidato a senador. Nada mais, nada menos. Seus cabos eleitorais esfalfavam-se, em Rondônia (ou terá sido Roraima?), para desenvolver sua campanha. Quase foi eleito.
Belo dia, estávamos no escritório, quando liga um desses cabos eleitorais. A dúvida: estamos confeccionando bonés para sua campanha. Vamos escrever o quê, nos bonés.
Lipnik não chegou a pensar 20 segundos:
- Lipnik na cabeça!
sábado, 24 de maio de 2008
International Red Flag Country
Tudo começou em fevereiro deste ano, quando nos preparávamos para ir visitar minha filha mais velha em New York. Temos primos em Bragança, Portugal, cuja filha estuda ballet. Eles já haviam comentado conosco a respeito da dificuldade de encontrar o equipamento necessário para os treinos da filha. Como parece haver de um tudo em New York, pedi a eles que me dissessem o que comprar. Meu primo, talvez para ser gentil e não responder que não era preciso comprar nada, pediu-me que, se possível, comprasse uma tal de Resistaband GM-503, da AllAboutDance.

Já em Manhattan, começamos a visitar – entre outras lojas – as especializadas em equipamentos para ballet. E nada. Uns nem sabiam do que se tratava. Outros diziam saber e indicavam outra loja onde certamente haveria o que procurávamos. Como as tais faixas acompanham um livro de exercícios, procuramos em livrarias, lojas de revistas etc etc.
Nada.
Em nosso último dia em New York, ao visitar uma enorme loja de equipamentos para ballet, consegui o endereço dos escritórios da Gaynor Minden na cidade. Não havia garantia de que, lá, eles vendessem os próprios produtos. Nem houve mais tempo de ir até lá.
Voltei ao Brasil injuriado. Ir a New York e não conseguir comprar uma única faixinha GM-503 para minha prima. Isso não se faz.
Resolvi encomendar pela Internet. Claro que não se tratava de atitude racional. Encomendar pela Internet eles mesmos poderiam encomendar, lá de Bragança. Mas não combinei com ninguém de ser sempre racional.
Feito o pedido, esperei que chegassem a minha casa, em São Paulo, as já famosas Resistabands.
O que recebi, ao invés de, foi um e-mail com um título igual ao deste post. Não sei bem como traduzir essa expressão. Mas “red flag”, no caso, tem cara de “lista negra”. Olha só o conteúdo do e-mail, seguido de uma tradução meia-boca mas que serve pra quem não entende patavina de inglês:
Thank you for your order. Unfortunately, we do not ship to Brazil at this time. We used to, but encountered numerous delivery problems. We are currently researching ways to guarantee the safe delivery of our packages to your country, while at the same time keeping shipping rates as low as possible. We hope to resume shipping to Brazil in the future. In the meantime, we have cancelled your order, and you have not been charged at any time.
Thank you.
AllAboutDance
Gratos por seu pedido.Infelizmente, não estamos fazendo remessas para o Brasil atualmente. Antes fazíamos, mas tivemos muitos problemas de entrega. Estamos buscando meios de garantir a entrega segura de nossos pacotes em seu país, tentando ao mesmo tempo manter taxas de envio tão baratas quanto possível. Esperamos voltar a fazer remessas para o Brasil no futuro. Nesse meio tempo, cancelamos seu pedido e você não foi cobrado por nada.
Gratos,
AllAboutDance
E quando eu digo que o Brasil acabou, tem gente que acha exagero.
Refiz o pedido, agora pedindo para fazerem a entrega em Bragança, Portugal.
As GM-503 já devem estar chegando lá, com a graça dos deuses.
sexta-feira, 23 de maio de 2008
Marcha para Jesus: apologia de crime
Vamos lá: muita gente fica cheia de dedos para afirmar que o pai e a madrasta da menina Isabella foram os seus assassinos. Mesmo depois da versão de uma terceira pessoa ter se transformado em piada. O argumento é sempre aquele: o cidadão só é culpado depois de sentença transitada em julgado. Beleza.
Agora, vem cá: o tal apóstolo Hernandes e sua bispa não foram já julgados, condenados e até já estão cumprindo pena? Então, pelos mesmos pesos e mesmas medidas, são culpados de crime. Se preferirem: são, sim, criminosos.
Vamos, então, ao artigo 287 do Código Penal:
Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime:
Pena - detenção, de 3 (três) a 6 (seis) meses, ou multa.
O pessoal que participou da tal Marcha para Jesus fez exatamente isso: enaltecimento de um criminoso. Publicamente.
O fato de tratar-se de um milhão e meio de pessoas não as torna menos incursas no artigo 287. Como na piada do mexicano:
- Un loco no! Miles de locos!
quinta-feira, 22 de maio de 2008
Tempo ganho
sábado, 17 de maio de 2008
Um poema de meu pai
No revirar velhos papéis guardados por minha tia, encontrei um poema escrito por meu pai. Está datilografado na arcaica Smith Corona dele, um dos poucos objetos que sobreviveram à minha prisão e dorme aqui em meu escritório. Talvez alguma de minhas irmãs tenha cópia desse poema. Eu o li hoje pela primeira vez. Lembro de minha mãe referir-se várias vezes a ele, mas nunca o havia saboreado.
Meu pai, nascido em Passos de Lomba, aldeia trasmontana, cedo partiu rumo ao Brasil. Teria, então, algo em torno dos 15 anos. Jamais retornou a sua terra natal. Nunca mais viu a mãe.
O poema, intitulado Mãe Querida, parece guardar em seu título uma ambigüidade. A mãe é a mãe biológica, mãe Amélia da Conceição, mas é – também – a mãe terra, a aldeia original. Não sei se a dubiedade foi proposital. Mas é evidente.
MÃE QUERIDA
[mantive a grafia original]
Alberto Augusto
É pequenina, um brinco de criança:
Tão linda jamais vi
Em serranias altas sobrepostas
A aldeia em que eu nasci
Ali há vida, há luz, prados extensos;
Riquíssimos jardins;
Campinas verdes, plurimatizadas;
Ribeiros em festins.
Um céu de anil puríssimo de estrêlas
Constantes no brilhar;
E a refletir-se em fontes cristalinas
Um pálido luar.
Vetusto casario guarnecendo
Vielas que só têm
Vestígios de mourama de outros tempos,
E curvas em vai-vem.
Há pardais, rouxinóis, há andorinhas:
Orquestra sem igual!
Bem parece viverem todo o dia
Em festa nupcial!
Os campos e os pomares enfeitados;
Grilada a cricrilar;
As searas imensas, brancacentas,
Ao vento a baloiçar.
Tal é a minha aldeia – se me lembro...
É linda para mim!...
Há muito... muito... que a deixei, chorando;
Chorando sem ter fim.
Deixei-a, sim; por lá ficou, saudosa;
E fui-me longe, além...
Também deixei a minha mãe sòzinha,
Da vida tôda o bem.
E nunca mais, oh não, tal voz ouvi
Ternuras a dizer...
Aquela face triste e desmaiada,
Não mais pude rever.
Lamento e me arrependo muitas vêzes
De um grande crime assim!
Padeço em cada hora, em cada instante,
A dor que não tem fim.
A minha mãe velhinha é todo o anseio
Meu, todo o ideal...
É todo o bem que anseio nesta vida;
Sim, ela é meu fanal.
Morando nesta terra linda e boa,
Feliz podia ser;
Mas minha alma, saudosa de outra alma,
Fugiu... quí-la rever...
Alçou em vôo de águia legendária.
Librando-se no ar,
Foi visitar a aldeia pequenina.
De lá não quis voltar!
Eu quero ir também, e não te esqueças,
Oh Deus do meu clamor.
Não te olvides de mim, que em ti confio
- Espero em teu amor.
Permite, ó Deus, consente eu veja ainda,
Mamãe querida, ali,
Por quem tanto chorei, tantas saudades
Eu sinto por aqui.
Não me deixes, Senhor, viver penando
Em tal separação;
Pois minha vida assim é um tormento
Que corta o coração.
Prossigo embalado na lembrança
- E o dia há-de chegar –
De ver-te a face imersa num sorrir
Mais doce que o luar!
Queres findar, bem sei, tua carreira;
Anseias o partir,
Mas para ver-me ainda, e abraçar-me,
Mais vida hás-de fruir.
E a aldeia pequenina e alcandorada,
Feliz há-de sentir
A ventura sem fim de duas almas
Unidas a sorrir.
Hei-de ver-te, e beijar-te muito, muito,
Dormir nos braços teus!
Hei-de sentir o teu amor profundo!
Cingir-te aos braços meus.
Não te eleves da terra, mas espera
Um beijo dêste amor.
Então demandarás o Paraíso.
Concede êste favor.
Minha avó Amélia não pôde esperar. Meu pai também se foi muito cedo.
De alguma forma, a ida dos três filhos de Alberto agora em setembro à aldeia em que ele nasceu será um reencontro dele com a mãe terra.
Por nosso intermédio.
Para minha alegria.
sexta-feira, 16 de maio de 2008
Lógicas não usuais
Estudei Lógica, durante alguns anos, sob orientação do professor Newton da Costa. Já falei um pouco dele, aqui.
Ele é um dos lógicos mais importantes do mundo. No Brasil, claro, não chega a ser tão reconhecido quanto Ronaldo, o Fenômeno, ou Hebe Camargo ou Ana Maria Braga etc etc. Cada país tem os ídolos que merece.
O professor Newton ficou conhecido internacionalmente por ter desenvolvido a teoria das lógicas paraconsistentes. São lógicas que admitem a contradição. Numa lógica convencional, se aparece uma contradição tudo desaba. É como um terremoto de nível 10 na escala Richter. Ele bolou uma lógica que permite a contradição sem que o mundo venha abaixo. Coisa de gênio.
Uma das minhas alegrias na vida é a de ter conhecido e convivido com o professor Newton. Esquisitão, exigia que os alunos o tratassem por senhor. Mas, ao contrário de muito professor titular, que entende ser depreciativo dar aulas para a graduação, Newton da Costa dava aula pra qualquer nível. Não se importava com essa história de majestade do cargo. Ao contrário de muito orientador de tese, propunha-se a ir à casa do orientando, à noite, pra discutir o trabalho.
É verdade que, na primeira vez que foi à minha casa, ao conversar comigo e com minha esposa, nós que havíamos acabado de sair da cadeia, perguntou:
- Como é que vocês podem ser marxistas? Isso é coisa de estúpidos!
Assim, na lata.
Algum tempo depois, ao voltar de viagem à Polônia socialista, à qual havia ido a convite para dar conferências, disse-nos, na mesma casa, sentado na mesma cadeira:
- O socialismo é maravilhoso!
Esse é o extraordinário professor Newton da Costa. Ou melhor, um pedacinho dele. Porque ele, em sua totalidade, é indescritível.
Tudo isso me vem à memória a propósito de uma tia minha, portuguesa que vive no Brasil há muitos anos.
Ela vai completar 80 anos semana que vem.
Já há algum tempo, começou a mostrar sinais de demência. Fomos com ela a uma médica geriatra. Orientados pela médica, colocamos para cuidar dela uma cuidadora. Minha tia sempre viveu sozinha. Vive em um apartamento de cômodo único. Ela adora o cantinho dela. Suportou a cuidadora durante uns três meses. Depois, expulsou-a de casa.
Como tínhamos de colocar outra cuidadora lá e sabíamos que ela não a aceitaria, meu primo e eu fomos até lá no domingo passado para tirar os trincos que ela tinha na porta de entrada. Caso contrário, ela não deixaria nenhuma cuidadora entrar.
Pedimos que uma amiga dela a levasse para dar um passeio enquanto arrancávamos os trincos.
Feito o trabalho, fomos embora e avisamos a amiga que já podia levá-la de volta.
Fiquei curiosíssimo sobre qual seria a reação dela ao voltar.
Soube, dia seguinte, ao falar ao telefone com a amiga de minha tia.
Ela entrou no apartamento, percebeu a remoção dos trincos e explicou à amiga, utilizando a lógica toda especial que a doença lhe proporciona:
- Meus sobrinhos estiveram aqui e consertaram a fechadura.
quinta-feira, 15 de maio de 2008
Einstein chuta o pau da barraca
A Folha de S.Paulo divulga, hoje (aqui, para assinantes Folha ou UOL), carta que Einstein escreveu a um amigo filósofo em 1.954, ano anterior a sua morte, na qual ele manifesta sua opinião sobre as religiões (aqui, parcialmente, traduzida para o inglês):
"A palavra Deus é para mim nada mais do que expressão e produto da fraqueza humana".
De quebra, ainda diz que não considera os judeus um povo escolhido. A religião judaica, “como todas as outras religiões, é uma encarnação das superstições mais infantis”.
Quanto à Bíblia: “uma coleção de lendas honráveis [ver nota], ainda que primitivas”.
A carta já era conhecida. A matéria da Folha se deve ao fato de que a carta, agora, vai a leilão. O surpreendente nela é que, segundo os historiadores, Einstein jamais havia manifestado muito claramente sua opinião sobre as religiões. A matéria da Folha acrescenta que a frase de Einstein mais citada sobre o assunto, até essa carta, era:
“A ciência sem religião é manca, a religião sem a ciência é cega”.
Claro que no mundo atual, politicamente correto, no qual jogam-se filhas pela janela ou escravizam-nas por anos em porões mas não se pode chamar ninguém de ceguinho, a frase dele teria de ser adaptada:
A ciência sem religião é portadora de deficiência motora, a religião sem a ciência é portadora de deficiência visual.
Claro, também, que os indefectíveis defensores das religiões dirão que, já próximo da morte, Einstein estaria gagá, ops!, seria portador de deficiência cognitiva.
Quanto a mim, sempre achei o gênio meio piradão. Talvez essa carta manifeste um de seus parcos momentos de lucidez.
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Nota: A palavra honrável não é registrada nem pelo Houaiss nem pelo Aulete. Existe honorável. Na tradução da carta para o inglês consta honourable, que o Merriam-Webster unabridged tampouco registra mas que o Cambridge on line dá como variante inglesa de honorable. Honorable poderia ser traduzido por admirável.
terça-feira, 13 de maio de 2008
A versão animal do
Estupra mas não mata
A Folha de S.Paulo publica, hoje (aqui, para assinantes Folha ou UOL),matéria sobre uma foca macho flagrada tentando copular com um pingüim. O cinegrafista filmou a tentativa (afinal frustrada) durante 45 minutos. O pingüim tentava escapar mas como a foca pesa até 120 quilos (dez vezes o peso de um pingüim) ele não conseguia.
Terrível, não é mesmo?
Acontece que na ilha Marion, onde a tentativa de estupro foi filmada, parece que o mais comum é que as focas comam os pingüins – literalmente.
O ex-governador de São Paulo, o inefável Paulo Maluf, ficou célebre – entre outras façanhas – por ter sugerido a estupradores em geral:
- Estupra mas não mata.
Seu conselho polêmico foi finalmente seguido pela tal foca.
Ou terá sido incapacidade da foca em discernir entre os vários sentidos do verbo comer.
Sabe-se lá.
segunda-feira, 12 de maio de 2008
A incrível Lei Rouanet
Já comentei, há algum tempo, a utilização da tal Lei Rouanet por parte de artistas consagrados.
Não sei se todo mundo sabe: a Lei Rouanet, trocada em miúdos, permite que você apresente a uma empresa um projeto cultural qualquer para que a dita empresa arque com os custos. O pequeno detalhe, nessa história, é que a empresa paga o empreendimento com grana do imposto que ela deveria recolher ao erário.
Resumo: o distinto público, o contribuinte, paga a brincadeira.
Que artistas desconhecidos se valham da tal lei, ainda é discutível. Eu, por exemplo, sou contra. Mas admito que haja argumentos para defender esse subsídio.
Agora: o fim da picada é ver artistas famosos, já podres de ricos, usando a Lei Rouanet para encher mais seus cofres.
Falando português claro: é uma pouca vergonha.
Todo esse meu azedume vem de ter lido, hoje de manhã, na Folha de S.Paulo, matéria sobre o lançamento do songbook do cantor Djavan. São três volumes com as partituras de todas as músicas do cantor/compositor. Assinante Folha ou UOL lê aqui.
Muito bacana, muito interessante. Só que esse trabalho foi bancado pela Lei Rouanet. E tem mais: não satisfeita por mamar nas tetas do contribuinte, a turma que preparou o songbook ainda tascou-lhe um precinho camarada: cada um dos três volumes custa R$ 130,00.
E o compositor ainda teve a cara de pau de declarar:
"Nem sabia que custava isso. Pedi para que fizessem o preço mais acessível possível."
Como diria a Hebe Camargo: Não é uma Gracinha?!
sábado, 10 de maio de 2008
Foi uma terceira pessoa
Pois é. Não foi Pero Vaz e Caminha que pediu ao Rei de Portugal emprego para um parente. Foi uma outra pessoa. Ela se intrometeu na carta sobre a descoberta do Brasil e acrescentou trechos apócrifos.
Nem pensem que Pedro I proclamou a Independência. Ele apenas teve um pequeno desarranjo intestinal às margens do Ipiranga. Algum gaiato aproveitou-se do imprevisto e gritou o Independência ou Morte.
Já Deodoro da Fonseca, esse, todo mundo sabe que era monarquista. Foi empurrado para a História. Mas quem proclamou a República foi o cavalo.
Por falar em cavalo, a Revolução de 30 teve como ponto alto o tal cavalo que os gaúchos amarraram no obelisco, no Rio. Ou não.
Getúlio não se matou. Foi uma terceira pessoa, ou quarta, ou quinta, sabe-se lá, que entrou no quarto e atirou nele. Até mesmo a Carta Testamento, que tantas lágrimas suscitou ao longo dos anos, não se sabe bem por qual terceira pessoa foi escrita.
E o País continuou sempre dominado por terceiras pessoas.
No caso de JK, a terceira pessoa era uma amante. Ou várias. Menos mal.
O golpe de 1° abril de 1.964 foi patrocinado por terceiros. No caso, os EUA.
Mas nem precisava. A esquerda brasileira não precisa de inimigos. Bastam-lhe os amigos.
E os governos militares? Meu deus! Quanta estupidez! Claro, toda de terceiras pessoas. Afinal, Castelo Branco, Costa e Silva, os Três Patetas, Médici, Geisel, Figueiredo, todos (ou quase todos, sei lá) foram primeiros alunos de suas turmas no Exército. Imaginem os últimos.
Daí fomos parar nas mãos dos Marimbondos de Fogo. Que loteou (os marimbondos, são, no caso, singular) o governo entre terceiras pessoas. Todas foram muito bem remuneradas e o mundo continuou girando em sua órbita.
E veio Collor. E PC Farias. Mas tudo o que amealharam foi obra de terceira pessoa. Tanto é que foram absolvidos. PC Farias foi assassinado, é verdade. Mas nem tudo são flores neste país terceirizado.
Itamar Franco foi o menos ruim. Tá certo. Era – e é – muito caipira. Parece ter sido o primeiro presidente da República que nunca tinha viajado a São Paulo. Pode?! Mas assumiu seus ridículos sem intermediários. Só valeu-se de terceiras pessoas pra implantar o Plano Real. Afinal, o negócio dele era outro, nada real.
Fernando Henrique eu me recuso a comentar. Já tinha escrito um monte de asneiras e governou produzindo mais asneiras. O que de bom foi produzido em seus governos foi obra de terceiros. Sempre a terceira pessoa.
Lula tem uma vantagem: ele troca de terceira pessoa a toda hora. Primeiro era o Zé, depois o Palocci, depois a Dilma, depois quem?
Depois ele, claro. Prontinho pro terceiro mandato.
Vai daí, não entendo a incredulidade da imprensa em relação à versão dos Nardoni sobre o assassinato de Isabella. Se sempre há uma terceira pessoa em tudo que acontece de relevante neste país, por que não haveria uma terceira pessoa na cena do crime?
Aliás, um detalhe: a versão me parece não ser obra nem do pai nem da madrasta de Isabella. Tenho a forte impressão de que a versão é obra de terceira pessoa.
Como sempre, em tudo.
domingo, 4 de maio de 2008
Responda rápido:
Quem é pior:
o austríaco Josef Fritzl, que manteve a filha em cativeiro por longos 24 anos e a obrigou a ter sete filhos dele;
ou
a elite do Nordeste brasileiro (os Sarney, os Gomes et caterva), que mantém o povo inteiro em cativeiro há uns 500 anos e o obriga a ter filhos sem qualquer planejamento, para que a miséria não corra risco de acabar.
Hein? Hein?
sábado, 3 de maio de 2008
Portugal e Brasil
quarta-feira, 30 de abril de 2008
Sobre baianos
O coordenador do curso de medicina da Universidade Federal da Bahia, Antonio Dantas, atribuiu o mal desempenho do curso no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) de 2007 ao baixo QI dos alunos.
E esclareceu: Baiano toca berimbau porque tem uma corda só. Se tivesse duas, não conseguia tocar.
É mais um dado a acrescentar à Mitologia do Baiano.
Sempre ouvi dizer que baiano é devagar, calmo, sossegado. Quando estive em Salvador pela primeira vez (e até agora única), aluguei um carro e fomos passear. Descobri, então, que os baianos são os sujeitos mais estressados que já vi na vida. Só um exemplo: numa avenida de três pistas, ao longo do mar, é comum ver um indivíduo colar o seu carro na traseira de outro que trafega pela pista mais à direita e buzinar alucinadamente. Por que ele não passa por qualquer uma das outras pistas permanece um mistério baiano, para mim.
Pra contrariar o tal de Antonio Dantas, há a música que aprendi quando moleque: “baiano burro garanto que nasce morto”.
Quanto aos grandes ídolos da música popular brasileira, de Caetano a Gal, de Gil a Bethania, todos adoram a Bahia. Todos moram no Rio ou em São Paulo.
Parece que, ao contrário da platéia da crucificação, no Calvário, todos sabem o que fazem.
sábado, 26 de abril de 2008
Para conhecer o Brasil
O livro de Nelson Werneck Sodré, O que se Deve Ler para Conhecer o Brasil, publicado no ano em que nasci (1.945), do qual tenho o exemplar n° 937 da 4ª edição (1.973), gasta pouco mais de 400 páginas para dar algumas dicas sobre como conhecer este país através da leitura.
Sempre que me solicitam orientação, recomendo o estudo desse texto.
Vou mudar de postura.
Por tudo que anda acontecendo, parece que para conhecer o Brasil basta estudar a vida e - digamos assim - a obra de Daniel Dantas.
quarta-feira, 23 de abril de 2008
Terremoto em Sampa
Há algum tempo transcrevi aqui o comentário que um amigo, engenheiro civil, fez a propósito de terremotos:
- Não é que o Brasil não tenha terremotos. O Brasil não tem é sismógrafos.
Pois bem. Já temos os tais sismógrafos. Agora há pouco tivemos um terremoto em São Paulo.
Deus seja louvado. A civilização está chegando.
sábado, 19 de abril de 2008
Pausa em Floripa
Demos uma chegadinha até Floripa. Ontem foi aniversário de meu sobrinho e saímos pra comemorar. Aproveito que aqui no prédio onde mora minha irmà há wi-fi dando sopa e consigo postar este aviso de pausa. Segunda-feira volto a Sào Paulo e à vida normal.
Bom final de semana a todos.
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