sexta-feira, 11 de janeiro de 2008
Era uma vez XXXV -
Comentários sobre o Primeiro Relato do Prata
O Prata, pelo menos neste primeiro texto, escreve para iniciados. Como este blog é lido por gente de todo tipo, inclusive fora do Brasil, é preciso contextualizar uma porção de coisas que ele relata.
Por exemplo, o Nilmario Miranda com que ele conversou para entrar no POC e com quem ficou preso é membro, hoje, do governo Lula.
Éder Sader foi um líder da assim chamada “esquerda revolucionária” brasileira, falecido já há uns 20 anos.
O Nicolau, Luiz Eduardo da Rocha Merlino, e a Taís, Ângela Maria Mendes de Almeida, foram os líderes do POC depois do rompimento com a Polop. A coisa é meio complicada mas, em resumo, é o seguinte: existia a Polop até 1.969. Aí a Polop resolveu se chamar POC, quando juntou-se à dissidência gaúcha do Partidão (Partido Comunista Brasileiro). Já em finais de 1.970, o POC rachou. Uma parte, liderada por Taís e Nicolau, ficou POC, mantendo a turma gaúcha do seu lado. O restante voltou a denominar-se Polop. Segundo relata o Prata, o Eder e o Nilmario teriam ficado na Polop (que, na verdade, era ORM, Organização Revolucionária Marxista. Polop era a sigla do jornal, Política Operária. Mas não vamos complicar mais do que já está, certo?)
É incrível, mas eu não me lembrava da saída (muito menos da tal “expulsão”) do Prata do POC. Agora, com o relato dele, lembro-me vagamente disso. De fato, ele já tinha saído quando fomos todos presos. O que mostra como é seletiva a memória.
O “caso Regis”: havia no POC um militante Regis, que não conheci. Mas parece que era conhecido de um montão de pessoas. Era importante na organização. Foi preso e deu com a língua nos dentes. Falou o nome de todo mundo etc e tal. Até hoje não sei quem era o tal Regis. Provavelmente o Prata saiba. Foi graças às inconfidências do tal Regis que Taís e Nicolau (Ângela e Merlino) resolveram sair do país. Regis foi defendido na Auditoria Militar pelo mesmo advogado que depois me defendeu, José Carlos Dias. Parece que Dias e o tal Regis haviam sido colegas de faculdade de Direito. Nunca vou esquecer que Regis (ou Dias?) teve a idéia de terminar sua defesa de maneira bastante engenhosa, citando o apóstolo Paulo: “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé.”. Era a forma ardilosa de garantir aos militares que não voltaria a militar e – ao mesmo tempo – garantir à esquerda que continuava a acreditar nos valores até então defendidos. Beleza.
Aliás, vem do “caso Regis” a queda do POC. Quando ele foi preso a coisa ficou complicada. Uma série de nomes ficou sendo do conhecimento da repressão. Nicolau e Taís resolveram ir para Paris. Emir Sader (irmão de Eder que ficara no POC) também se mandou.
Mais adiante, já com a organização em frangalhos, foi preso o Jonas (que ficaria preso comigo um bom tempo, na mesma cela, e de quem já falei aqui). Jonas conhecia o endereço da família do Nicolau, em Santos. Sabia que o dito cujo estava na França. Resolveu fornecer o endereço pra aliviar o “pau”. Não haveria maiores conseqüências em a repressão ir até a casa da mãe dele. Só que ele voltara sem que o Jonas soubesse. Daí foi preso. O resto das conexões não sei. Sei apenas o que fiz. E vou contar aqui, logo, logo. O resultado prático é que todo mundo foi preso. Como conta o Prata, ele foi preso graças a outras conexões, com o tal de PRT (haja sigla!). Quanto a mim, pelo menos, jamais falei, ou mesmo pensei, ter sido o Prata que fez todo o POC ser preso. Aliás, meu texto sobre o Prata, aqui nesta série Era uma vez, é até bastante elogioso. Eu acho.
Quanto ao que o Prata diz, de ser excluído das conversas do pessoal do POC, só se foram outras pessoas do POC. Nós, da cela 12, Toninho, Melo, Jonas e eu, jamais tivemos qualquer discriminação em relação a ele. Aliás, no texto sobre ele, comento minhas conversas com ele em banhos de sol.
Quanto ao documentário do qual participou a filha do Prata, como parte da direção e como personagem, há uma série de coisas estranhas:
Diz-se, no documentário, que ela nasceu em 1.969. Ora, o Prata afirma, adiante, que ela tinha 9 meses quando ele e a Eleonora foram presos. Eles foram presos em julho de 1.971. Conclui-se que a filha do Prata não sabe muito bem quando nasceu. Ou estarei sendo muito duro nessa conclusão?
O documentário, aliás, parece ser um belo exemplo do jornalismo atual: tudo errado. Prata não foi preso em 1.970. Foi preso um ano depois. Graças a tudo isso, não sei porque o Prata ainda se preocupa quanto ao fato do documentário dizer que ele foi preso antes da Eleonora. Pô. Se eles erram tudo, por que diabos iriam acertar na ordem das prisões?!
A filha do Prata diz, ainda, que o Paulo Vanucchi lembra dela chegando na OBAN. Já eu, lembro do Paulo Vanucchi de pijama de seda, andando pela ala do Presídio Tiradentes, à espera do papai que teria o privilégio de visitá-lo na cela. Coisas da ALN. Guerrilheiros de pijama de seda. Quero deixar claro que nada tenho contra pijamas de seda. Já quanto a guerrilheiros, acho que combinam mais com floresta, menos com gabinetes em Brasília.
O Prata diz que viu, aqui em meu blog, “histórias mal contadas”. Tudo bem, Prata, talvez você tenha razão: devo escrever mal pra burro. Mas sempre deixei claro que falava de minhas memórias, com todas as falhas e lacunas que decorrem disso. Mas pediria a você que fosse mais específico. Dissesse exatamente onde estão as coisas “mal contadas”. Deve haver muitas, mas a coisa colocada assim, de forma genérica, esculhamba com tudo. Devagar com o andor. O santo é de barro.
Quanto ao João Batista Mares Guia, não o conheci mais gordo.
Será que o Ricardo a que ele se refere no link acima é o Prata? Conta aí, Prata: você freqüentava a quitanda do Romeu?
Quanto ao meu “depoimento”, citado pelo Prata (sim, Alberto Augusto Júnior sou eu), sei lá. O fato é que não fui convidado a integrar a Direção Nacional do POC pelo Prata e pelo Laurindo. Ao contrário, só os conheci depois. Como é que isso foi parar no depoimento não sei. Sei que fui convidado a integrar a Direção Nacional pelo Nicolau e pela Taís. E seria muito mais fácil declarar isso, certo? Considerando que os caras que tomavam os depoimentos eram uns energúmenos, tudo é possível.
A casa da Av. Chibarás me foi passada pelo Nicolau. Jamais partilhamos a mesma residência. Eles (Taís e Nicolau) saíram e eu entrei. Sim, nós dois – Nicolau e eu – nascemos e vivemos nossa adolescência em Santos. Mas soube disso mais tarde, não me lembro mais quando. Nunca o vi em Santos.
Sua afirmação, Prata, de que “se os arquivos de interrogatórios fossem abertos algumas considerações veiculadas em seu Blog seriam modificadas com certeza“ pode ser verdadeira ou falsa. De qualquer forma, carece de especificação. Diga porquê. Não faça afirmações (quase acusações) genéricas.
Sua longa militância na esquerda, Prata, ao contrário da minha, que foi relativamente curta, pode trazer contribuições importantes para a compreensão de tudo que vivemos naquele período.
Daí eu considerar muito bom a gente prosseguir essa conversa.
Aguardo seu próximo texto.
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