domingo, 26 de março de 2006
Era uma vez - XXX
Jorge Mattoso, o Renato do POC
Já resumi aqui a formação do POC (Partido Operário Comunista) como junção de dissidência da POLOP com dissidência gaúcha do Partidão.
Essa dissidência gaúcha deu muito trabalho. Liderada pelo Emílio (nome de guerra de Fábio), vivia às turras com a direção nacional, que ficava em São Paulo.
Houve até um episódio divertido, no meio de tanta briga. Mas, pra falar dele, preciso fazer um rodeio antes. Quando comecei a participar de uma OPP (Organização Para-Partidária), adotei o codinome Eduardo. Já quando ingressei no POC, disseram que teria de escolher outro nome de guerra.
Nome de guerra? Escolhi Guerra. Pareceu-me adequado. Afinal, até sisudos revolucionários marxistas-leninistas precisam fazer uns trocadilhos, vez em quando.
Mas voltemos a nossos belicosos gaúchos. Iria haver um congresso regional do POC em Porto Alegre. A direção nacional temia que o pessoal do sul resolvesse romper com o restante da organização. Fui destacado pra representar a direção nacional no tal congresso.
Fui a Porto Alegre, encontrei-me lá com uma militante simpática e um tanto rechonchuda que me levou em seu carro até uma casa de classe média alta na qual ficamos fechados – em infindáveis reuniões – durante todo um final de semana.
Não tive muita dificuldade em aceitar vários dos pontos de vista do pessoal do sul, assim como eles se mostraram surpreendentemente cordatos em relação a minhas opiniões.
Resumo: acordo completo. Tudo resolvido na santa paz.
Voltei a São Paulo e fui encontrar-me com a Taís e o Nicolau na casa que eles ocupavam, no bairro de Moema, casa que eu viria a ocupar quando da viagem deles para a França. Quando lá cheguei, levado pelo Nicolau, estava presente, também o Emir Sader.
A Taís já havia recebido notícias do sul. E perguntou:
- Guerra, como você conseguiu não brigar com os caras?!
Tentei iniciar uma explicação. Antes que pudesse dizer qualquer coisa, o Emir, que se balançava em uma gostosa cadeira de balanço, disse, como quem pensa em voz alta:
- Que concessões terá feito o camarada Guerra.
A ironia fina do Emir impediu que a conversa prosseguisse em tom sério.
Pois bem. Esse pessoal do sul tinha um representante que morava em São Paulo. Era um gaúcho que conhecíamos pelo nome de guerra de Renato.
Renato atazanava minha vida. Tudo ele contestava, nada estava bom pra ele, jamais. Não sei de seus antecedentes, de como ele foi parar na esquerda, mas tudo indica que teve largo treinamento em assembléias estudantis, pois usava de todos os conhecidos truques usados pelos líderes estudantis pra embaralhar qualquer assembléia e encaminhar as votações para o resultado por eles desejado.
Para cúmulo do meu azar, Renato fazia parte da mesma célula que eu ( o POC era organizado em células, que se reuniam periodicamente). Lembro de um episódio divertido, um dos poucos engraçados ocorrido em nosso tumultuado relacionamento. Combinamos, certa reunião, que todos leriam o 18 Brumário, de Marx, para ser discutido na reunião seguinte. Reunião seguinte, Renato chega eufórico:
- É aqui! É aqui!
Todos o olharam com ar de I beg your pardon.
E ele:
- Eu sempre ouvi essa de que a história se repete, uma vez como tragédia, outra como farsa. Não sabia de onde tinha saído isso.
Esse era Renato. Ingenuozão, porque meio garoto ainda. Mas sagaz na hora de criar chicanas.
Quando fomos presos, Emílio, por ter sido muito torturado e ter visto sua companheira praticamente enlouquecer durante as torturas, recolheu-se, tornou-se cordato. Perdeu, graças aos céus, aquela arrogância que antes exibia.
Já com Renato, passou-se o contrário. A estúpida morte de Nicolau já deixara os homens do DOI-CODI proibidos de utilizarem-se do pau-de-arara. Renato, logo nas primeiras cacetadas que levou, teve um braço fraturado. Foi levado ao hospital e não mais sofreu torturas.
Sentiu-se herói.
Se já era difícil suportar sua atitude quase sempre insolente, daí pra frente a coisa ficou impossível.
Nunca mais conversei com ele.
Entrou para o PT. Sei lá por quais caminhos, caiu nas graças da marquesa Suplicy e seu príncipe encantado Luis Favre.
Virou Secretário de Relações Internacionais da prefeitura de São Paulo durante a gestão da socialite. Foi acusado de gastar os tubos da prefeitura viajando adoidado, mundo afora.
Isso o levou, quando Lulla assumiu, a ganhar a presidência da Caixa Econômica Federal, que ele acaba de desmoralizar, com o affair da quebra de sigilo do caseiro que afirma que Palocci vivia na casa da esbórnia da turma de Ribeirão Preto.
Ao que tudo indica, continua mestre em chicanas.
Sai, satanás.
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