domingo, 23 de janeiro de 2005

Casamento


Ontem à noite, meu filho disse, como quem não quer nada, que hoje iria se casar. Razões burocráticas, coisa e tal. O casamento mesmo, pra valer, vem mais adiante. Até aí nada demais. O que me surpreende não é a sem-cerimônia com que a coisa é tratada.
Contrário. Nos anos sessenta do século passado, eu era capaz de jurar (e comigo milhões de pessoas) que o casamento – como instituição – não duraria mais dez anos. E, eis senão quando, as pessoas continuam a casar-se. Sem o menor pudor.
Certo que se naquela época eu fosse um pouquinho mais perspicaz já teria desconfiado que a coisa não ia derreter assim, sem mais nem menos. Lembro de um casamento a cuja festa compareci, penso que em 1.969. A noiva era arquiteta, o noivo ator de teatro. Toda a cerimônia foi recheada de pequenas ironias, sarcasmos até. A noiva usava um vestido tão curto que a calcinha era do mesmo tecido do vestido, dado que acintosamente visível. No entanto, no entanto, a cerimônia foi cerimônia, o casamento, casamento. Com direito a celebração religiosa, festa, buquê e – inevitável, naqueles tempos – alguns baseados a circular pelos convivas.
As pessoas – de lá para cá – passaram a separar-se por qualquer dá-cá-aquela-palha, as famílias tornaram-se “famílias generalizadas”, filhos de vários casamentos diferentes a conviver mais ou menos harmoniosamente. E a turma sempre casando. Cada vez mais. E com cerimônia religiosa, festa, aquele desfile kitsch que desafia sempre os limites da minha imaginação.
Enfim, pra encurtar a conversa, já aceitei que casamento sempre vai existir, não tem jeito. Mas assim como dá pra discutir se a noiva deve trocar de vestido a cada meia hora durante a festa, se vale a pena alugar aquele carro antigo pra trazer e levar embora os noivos, se a cerimônia religiosa deve ser ecumênica ou se é melhor só caprichar num ritual zen, se a festa deve ser em um sítio afastado da cidade ou se deve ser mesmo em bufê, com aquele conjunto musical que imita desde os Beattles até Vicente Celestino, também quero discutir os critérios da formação do casal.
É. É isso mesmo. Até agora só falamos de como deve ou não deve ser o casamento do garotão com a donzela. Mas e quanto a esses dois? Como é que eles se esbarraram na vida? Por que decidiram casar um com o outro?
O habitual, no último século, nos países ocidentais, tem sido os dois se elegerem mutuamente. E os critérios do coração sempre são louvados como prioritários. Mas isso é bom? Dizendo melhor: será que não há outro jeito mais eficaz?
Para ser direto, que este post já está a ficar muito extenso, proponho o retorno ao antigo método da escolha dos nubentes (já que é pra ser antigo, vamos usar também o vocabulário de antanho) pelos adultos por eles responsáveis.
Como parece que disse Bernard Shaw, a juventude é coisa muito importante pra ser deixada aos cuidados dos jovens. E isso inclui o casamento.
Parece-me claro, óbvio até, que os pais têm muito mais condição de escolher o par pra seu filhote do que deixar que esse ser imberbe (quase ia dizendo imbecil, mas vou tomar cuidado pra não pegar muito pesado), ou essa moçoila desmiolada, decida algo tão importante pro seu futuro.
Começa que essa história de respeito aos sentimentos, coisa e tal, não cola. A garotada só faz o que o grupo faz. Veste as roupas que a moda impõe, freqüenta os lugares que estão na onda (e essas ondas mudam com uma rapidez espantosa). Resumo: não consigo lembrar de um único exemplo de algo que o garotão ou a moçoila façam seguindo critérios próprios, estritamente pessoais. Por que raios iriam escolher o cônjuge segundo outro método. Vão escolher mal, já se vê. Depois, é aquela confusão pra consertar. E os sentimentos de culpa? Terríveis.
Se os pais escolhem com quem casar o respectivo rebento, não só há chance muito maior de a coisa dar certo. Há também a vantagem de que – se der errado – o casal já terá a quem culpar: os próprios pais. E todo mundo sabe que uma das coisas mais deliciosas do mundo (quase tão boa quanto arroz doce) é jogar culpa nos pais.

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