Completei 70 anos
ontem.
Antes que me esqueça,
agradeço a todos que me desejaram saúde, felicidade, paz, enfim,
tudo de bom.
Acontece que meu
aniversário não foi tão bom como eu gostaria que tivesse sido.
Graças a algo chamado
Brasil.
Eu havia escolhido uma
comemoração discreta, apenas eu e a pessoinha paciente que me atura
há anos.
Eu faria 70 na
segunda-feira, 23. Como moramos em Bragança, Portugal, fomos para o
Porto na sexta-feira. Jantamos no Chanquinhas, um restaurante
tradicional, soberbo, instalado em uma ruela de Leça da Palmeira, em
Matosinhos. Cidade grudada ao Porto. Saboreei um arroz de cabidela
insuperável. Regado a bom vinho do Douro, evidente.
Havia meses que eu
comprara ingressos para o show de António Zambujo, no Coliseu do
Porto, sábado à noite.
Para segunda-feira
havíamos reservado lugar na Casa de Chá da Boa Nova, também em
Leça da Palmeira, restaurante projetado pelo arquiteto Siza Vieira.
Ao chegarmos em casa,
vindos do Chanquinhas, minha filha Sofia, que vive em São Paulo, me
chamou pelo Skype para me dar notícia de um documento que me chegara
do Ministério da Fazenda.
Para os amigos que não
sabem, sou aposentado da Receita Federal desde Julho de 2.011. Há
quase quatro anos. Vivo dessa aposentadoria e das reservas que
consegui juntar em uns 50 anos de trabalho. Sofro as vicissitudes do
câmbio, pois recebo em reais e vivo em euros. Mas isso não me tira
o sono.
Foi atônito que –
aos poucos – dei-me conta de que o documento que minha Sofia
recebera informava que minha aposentadoria havia sido considerada
ilegal pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
A única atenuante
constante do documento era a de que eu não precisaria devolver os
valores recebidos nesses quase quatro anos pois me consideravam de
boa fé. Mas nada mais receberia a partir de então.
A sensação que tive
foi a que imagino ser a de alguém que vivencie um terremoto. O chão
passa a não inspirar confiança e não se sabe onde buscar proteção.
É evidente que nossa
programação comemorativa foi imediatamente suspensa. Voltamos a
Bragança como quem retorna ao útero materno.
Ajudado por um amigo
desses que é preciso viver várias décadas até conseguir-se um,
vivi apenas exatos três dias de pesadelo.
Passadas essas
fatídicas 72 horas, fui informado de que havia sido cometido um erro
na transcrição da informação enviada ao TCU e que tudo deverá
resolver-se em breve.
O sentimento inelutável
que me invade é o de querer distância desse país.
Mais não digo para não
ofender – involuntariamente – os meus queridos que nele vivem.