segunda-feira, 26 de maio de 2014

Por que sou ateu - 2

Meu pai morreu quando eu tinha dezesseis anos. Esse fim precoce impediu que tivéssemos conversas adultas, de homem pra homem. Mesmo porque, nessa altura, eu já saíra de Santos para estudar em São Paulo. Só nos víamos nos fins de semana.

Quem sabe essa minha propensão a discutir assuntos de doutrina religiosa tenha um bocadinho a ver com não ter podido fazê-lo com ele...

Com a morte de meu pai, a pressão para que eu me tornasse também pastor foi grande. Fui até levado a fazer um sermão na igreja na qual ele havia sido pastor. Por ironia, soube depois que uma senhora converteu-se em função de minha pregação. O que mostra que quando alguém quer crer, qualquer discurso serve...

Se eu quisesse, teria futuro garantido. Bastava seguir a carreira de meu pai. Mas, apesar de ainda ser crente, naquela época, meus planos para minha vida eram outros.

Ao longo de meu curso de engenharia aproveitava algumas das horas de lazer para ler livros sobre religião. Algo como o Por que não sou Cristão, de Bertrand Russell (disponível na Internet, em pdf), por exemplo.

Essas leituras foram a pá de cal no que me restava de crença. Meu gosto pela Lógica não me permitia continuar a aceitar as verdades sem pé nem cabeça que as religiões me ofereciam.

Salta aos olhos, por exemplo, o absurdo lógico da prática - muito comum entre os cristãos - de citar versículos da Bíblia que a dão como a Palavra de Deus com o intuito de “provar” que ela é a Palavra de Deus.

Paralelamente a essa minha migração para a descrença, ampliava-se no Brasil o ambiente ditatorial instaurado em 1.964.

Durante meu curso de engenharia eu adotara uma postura política anarquista. Havia algum parentesco entre meu rompimento com a fé religiosa e o anarquismo.

Ao final do curso de engenharia, contudo, resolvi fazer o curso de filosofia. E mergulhei de cabeça no clima revolucionário que predominava no ambiente acadêmico um pouco por toda parte do mundo. Estávamos no histórico ano de 1.968. Isso levou-me ao marxismo-leninismo e – em vários sentidos – de volta ao espírito religioso.

Durante três anos dediquei toda minha energia à luta revolucionária.

Depois de um ano e meio na prisão, em convívio forçado com grande parte da chamada Esquerda Revolucionária, saí vacinado contra toda e qualquer religião. Cristianismo e Marxismo passaram a ser, para mim, apenas objetos de estudo. Mesmo assim, minha dedicação maior voltou-se para o estudo da Lógica e para a leitura dos clássicos gregos.

O estudo de Lógica foi o que consegui levar mais longe, favorecido pela orientação que passei a receber de um dos mais importantes lógicos do século XX, o prof. Newton da Costa.


Já se disse que cultura é aquilo que nos fica depois que esquecemos tudo o que estudámos. Hoje em dia, se tento ler alguns resultados a que cheguei em Lógica, já não mais entendo o que leio. Mas o que me ficou foi fundamental para o restante de meus estudos até hoje.

 [continua]

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