quarta-feira, 4 de julho de 2012

As palavras eram poucas



Essa casa guarda o mistério. O jornal PÚBLICO conta um pouco da história em sua edição de hoje.
Santa Maria da Feira é uma pequena cidade do distrito de Aveiro, um tanto ao sul do Porto. Tem pouco mais de 11.000 habitantes.
A casa amarela da foto fica no seu centro histórico.
Emanuel sempre aí viveu. A família era: pai, mãe, uma irmã e ele. O pai faleceu de cancro quando Emanuel tinha lá seus 15 anos.
Fez seus estudos básicos e começou um curso superior de Economia na Universidade Portucalense. Não chegou a completar o primeiro ano. Trancou-se em casa e nunca mais ninguém o viu.
Tem, hoje, 38 anos. A mãe, funcionária do Registo Civil, agora aposentada, pedia que respeitassem a vontade do filho - a de não ser visto - sempre que os amigos dele o procuravam.
A irmã, pouco mais nova, casou-se e partiu. Emanuel não foi ao casamento nem nunca viu o cunhado.

Um primo da mãe de Emanuel insistiu em vê-lo, sem sucesso. Levou o caso à justiça, ao Ministério Público (MP) e, por fim, à Segurança Social. Foram feitas investigações que a nada levaram.

Agora, parece que alguém conseguiu falar com Emanuel:
"António Espassandim, uma das testemunhas ouvidas ontem pelo MP, contou que esteve com Emanuel no domingo. 'Está muito bem, conversa sobre tudo, política, futebol. É uma pessoa informada, um rapaz inteligente',  revelou ao PÚBLICO".

Um amigo de infância, vizinho, que cresceu quase paredes-meias, não o vê há cerca de 20 anos. “O Emanuel era uma pessoa normal, sociável, estudava, era pacato, não era de se meter em confusões”, garante. De um dia para o outro, deixou de o ver. Tal como os amigos mais próximos, tentou perceber o que se passava. Perguntava por ele à família. “Mas as palavras eram poucas”, diz. “É estranho e alguém tem de fazer alguma coisa, porque é de um ser humano de que estamos a falar.”


Diante de tudo isso, o povo cria mitos ("ele morreu e a mãe o está a velar" etc etc)  e os especialistas derramam possibilidades explicativas ("não [se] descarta a possibilidade de um quadro de esquizofrenia simples, em que se enquadram o desinteresse de experienciar relações sociais, a apatia, o isolamento social ou a incapacidade de experimentar prazer." Etc etc).


Penso que, nessa história, as palavras devem mesmo ser poucas.

2 comentários:

saltapocinhas disse...

também ouvi essa história incrível.
as doenças psiquiátricas (que com certeza é o que ele tem) são difíceis de tratar, muito mais ainda se for sem a ajuda do doente.

Regina Reis disse...

Amigo!
Vc escreve conto com uma criatividade fantástica! De crônica eu já sabia que vc revela um talento primoroso. Agora no conto, amei... E, depois fiquei pensando: é inventado ou real? Nossa1 Que belo!
Parabéns!
Regina