quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

O Plano B


Dia desses, almoçava com colega de trabalho. Ele, agitadíssimo, descrevia o carnaval que faria no ambiente de trabalho caso obtivesse a liminar em Mandado de Segurança na qual depositava todas as suas esperanças de solução de seus problemas pessoais e familiares.
A certa altura, a euforia dele tendo feito pequena pausa, perguntei:
- E você tem um plano B?
- Nem quero pensar nisso, ele emendou, de voleio.
Pensei em argumentar que o juiz poderia perfeitamente negar a liminar. Em tempo, percebi que não havia clima para tal ponderação.

Mas passei a pensar sobre o tal Plano B. Não pra ele, evidente. Não tenho elementos pra isso. Mas quanto a mim. Qual o papel do plano B em minha vida.

Fiquei surpreso ao constatar que quase sempre na vida fui levado a viver o Plano B. E percebi isso sem nenhum sentimento de derrota, sem qualquer mágoa. Penso que isso talvez se deva ao facto de que temos desejos sempre mais amplos e maiores que nossas possibilidades concretas. O que não significa trocar algo bom por algo podre. Não. Quem sabe o objetivo primeiro, o Plano A, não fosse desastroso. Ninguém sabe.

Quando pequeno, meu desejo secreto era ser jogador de futebol. Jogava botão em clima de sonho. Futebol de praia era sempre um desafio. Avaliação de possibilidades.
Mas... tinha um pai severo, pastor baptista quando ainda não tinham inventado os Atletas de Cristo. Quando ser jogador de futebol e evangélico eram coisas mutuamente exclusivas. Quando ainda não havia Kaká e seus gols dedicados ao Senhor.
Resumo: adotei o plano B. Fui ser engenheiro.

Lá pelo início do quarto ano de engenharia percebi que não tinha a mais remota vocação pra profissão. E enveredei por outro plano B: Filosofia.

Quando já ia me dando conta de que Filosofia era algo reservado a abastados, mergulhei na militância política, na busca de um socialismo a ser implantado no Brasil. Desta vez o plano B me foi imposto contra minha vontade: três anos de cadeia e dez anos de direitos políticos cassados.

De volta às ruas, como Filosofia não enchia barriga, fui trabalhar em Matemática, como professor universitário. Durante minha pós-graduação, percebi que os cursos da área de computação eram muito mais fáceis do que os da Matemática Pura. Como precisava acumular créditos para o Mestrado, comecei a fazer um monte deles. Os milicos não queriam mesmo que eu continuasse na USP. Paciência. Plano B, de novo. Pensei: o que que eu sei, que leve alguém a pagar por isso? Computação, claro.
E dá-lhe plano B. Foram uns vinte anos de trabalho na área de Sistemas. Puro plano B.

E no amor, então. Tenho a sensação, quase certeza, de que todas as mulheres de minha vida me viram como plano B. Não. Não se trata de paranóia ou algo assim. É simples: para parodiar Groucho Marx, eu jamais me casaria com uma mulher cujo grande ideal na vida fosse casar comigo. Prefiro mulheres inteligentes.

Escreveria páginas e mais páginas sobre meus planos B. Quando resolvi ter filhos, por exemplo, comecei a desenvolver todo um programa de ensino para que eles fossem educados em casa. Como aconteceu de os amigos quase me matarem de tanta crítica, parti para o plano B: escola convencional e não se fala mais nisso. Hoje meus filhos são pessoas normais. Diria que bem acima da média, não fosse isso corujismo explícito.

Outro exemplo: todo mundo gostaria de atravessar a vida sem precisar de psicanalista (quer dizer: todo mundo não, só os normais, como diria Nelson Rodrigues, em outro contexto). Eu também. Mas não deu. A certa altura do campeonato tive de recorrer ao plano B, que no caso chama-se Luis Meyer. Cinco anos de quatro sessões por semana. Fantástico plano B. Experiência maravilhosa. Aliás, o único defeito do Meyer é ser amigo do FHC. Mas algum defeito ele tinha de ter, né mesmo?

E dá-lhe plano B. Agora mesmo: meu grande sonho é ir morar em Portugal. Mais especificamente no distrito de Bragança, perto de minha aldeia ou mesmo nela, se possível.

Será possível? Ou terei de adotar outro plano B?

Aceito sugestões.

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