sábado, 8 de outubro de 2011

A Cópia


E havia um deus todo poderoso que morria de inveja de outro deus, um deus todo criativo, muito engenhoso e jeitoso.
Vai daí, o todo-criativo teve a ideia de criar um mundo.
E começou por iluminá-lo de modo deslumbrante.

Roído pela inveja, o todo-poderoso pôs-se a imitar o rival.
Por desgraça, seu projeto de iluminação foi mal calculado. A energia programada não permitia intensa iluminação ininterruptamente.
Havia blecaute todo santo dia. Os áulicos, para disfarçar, pediram ao marqueteiro do todo-poderoso que imaginasse algo para amenizar o fracasso.O marqueteiro começou por chamar os blecautes de noites. Muda-se o nome, muda-se a imagem, como todo publicitário sabe. E, em meio à escuridão, conseguiu – com um quase nada de gasto energético – que algumas luzinhas piscassem. Construiu até uma luminária de luz branca (para economizar energia) que se acende durante a tal noite, é verdade que nem sempre por inteiro.

Em uma segunda etapa, o todo-jeitoso separou as águas da terra das águas dos céus.
Já o poderosão se atrapalhou todo para imitar essa separação e terminou por inventar a chuva e seus derivados menos amistosos: granizo, nevasca etc etc. Em compensação, tornou-se o patrono da indústria de chapéus-de-chuva, capas impermeáveis e que tais.

Na terceira fase, aquela em que o todo-faceiro criou as ervas dos campos, as árvores e tudo aquilo que faz a alegria dos vegetarianos, o grosseirão, o outro, até que não fez tão feio. É certo que andou a criar as urtigas. Mas nada que se compare às bobagens posteriores.

Por ter o deus-artista-plástico dado uma paradinha pra repor energias, o omnisciente (mais tarde conhecido por Google) resolveu gastar a quarta etapa a tentar convencer toda a gente que essa história de dia e noite, sol e lua, estiagem e chuva, era o supra sumo.

Na quinta fase a lambança foi total. Enquanto o primeiro-designer criava pavões, pássaros deslumbrantes em sua plumagem, peixes coloridos etc etc, o todo-invejoso começou por criar o rato ao tentar construir um pássaro. Na segunda tentativa saiu-se pouco melhor: criou o morcego. E dá-lhe moscas, pernilongos, gafanhotos etc etc. Isso pra não falar em uns bichos totalmente desengonçados que Ele mesmo percebeu que haviam saído fora de esquadro e lançou-os ao fundo do mar, pra evitar maior vexame.

É ocioso enumerar a quantidade de asneiras produzidas pelo todo-imitador. O cúmulo ele o atingiu ao criar o homem.
Mal havia construído o cidadão, se deu conta de que não o havia dotado de forma alguma de reprodução.
Toca a construir um complemento que – ao ser-lhe acoplado – permita a perpetuação da espécie. Aliás, isso era necessário porque o homem foi criado com data de validade.

Uma digressão: tive um mestre que ensinava: quando algo começa errado, não tente consertar, desista.
Pois o omnipresente parece ter faltado a essa aula. A cada erro, uma tentativa de correção.

Para sanar as lacunas na construção do homem, criou a mulher.

Levou-os a habitar um Paraíso que paraíso não era. Ao menos a pedagogia moderna ensina que não há paraíso onde há qualquer proibição.
Sabe-se lá por quais motivos, o todo-atabalhoado inventou um paraíso em que uma fruta era para não ser comida.
Ainda por cima, quando Adão e Eva resolveram valer-se da melhor coisa que o todo-desastrado criara – o sexo – chutou-os do tal Paraíso e rogou-lhes várias pragas (trabalho, dor de parto etc etc).

Enfim, um desastre.

Já o Universo do todo-engenhoso ficou uma graça.
Não à toa, cada vez é maior o número de indivíduos nesse nosso mundo imperfeito que cultuam o deus todo-criativo.

2 comentários:

Helga Ilse Bekman disse...

Sensacional, adorei. Bjim

Santos Passos disse...

Fico feliz por você ter gostado.
Beijinhos