segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Dia da caça


Lá pelo mês de julho um operador de telemarketing ligou pra minha casa pra falar com a Baixinha. Queria oferecer mundos e fundos de um banco (pensando bem, só os mundos, porque os fundos eles não distribuem assim, sem mais aquela).
Por já estarmos saturados de tanta invasão de privacidade via telefone (é um tal de telefonar pra oferecer maravilhas ou pedir algumas migalhas de ajuda humanitária), a Baixinha soltou os cachorros:
- Não quero e tenho raiva de quem quer. Boa tarde.
E desligou.
O cidadão começou a ligar várias vezes. Como essas ligações são gravadas, ele ligava e ficava mudo. Não satisfeito, ligou de um celular e passou um pito na Baixinha.
Daí pra frente, passou a ligar várias vezes por dia do tal celular.
Ligava e ficava mudo.
Reclamei com o tal banco.
Depois de muitas idas e vindas, concluíram que não era deles o telefone do qual o indivíduo nos telefonara.
Passado um tempo, começamos a receber ligações a cobrar de um outro celular. Atendíamos e ninguém falava nada do outro lado. Logo concluímos que devia ser o maníaco do banco.
Como as ligações se repetiam, várias por dia, todo dia, resolvi partir para o ataque.
Escrevi um texto, pus na tela do computador e liguei para o indivíduo a partir do Skype. Não sem antes me certificar de que o número que apareceria no celular dele seria inócuo. Se ele retornasse a ligação, nada aconteceria.
Ele atendeu. E eu passei ao texto à minha frente, na tela, procurando fazer voz de locutor de FM:



Bom dia!
Estamos ao vivo, pela Gama FM.
Seu telefone foi sorteado. Se você responder nossa pergunta, ganha um radio relógio despertador.
Seu nome?
[ele deu o prenome]
Perfeito, Felipe.
Vamos à pergunta. Capricha na resposta, Felipe.
Preste atenção. Nosso patrocinador é Casas Bahia.
E eu pergunto:
Qual a loja em que você compra os melhores produtos pra sua casa nas melhores condições de financiamento?
[ele foi firme: CASAS BAHIA]
Perfeito, Felipe! Excelente. Claro, é nas Casas Bahia.
Você acaba de ganhar um magnífico rádio relógio despertador. Ele agora é todo seu. Só peço que você aguarde na linha que já falo com você para anotar seus dados. Não desligue.
E vamos voltar à nossa programação musical.


Dei um tempinho e passei a falar com voz normal:


Felipe. Agora já não estamos mais ao vivo. Me dê seu nome completo.
[ele deu o nome todo]
Deixa eu registrar aqui no nosso cadastro.
Seu endereço.
[ele forneceu e explicou onde ficava. Por sinal, perto de minha casa]
Etc. Etc.


De início, ele duvidara:

- Isso é um trote?

Não, Felipe. Estamos ao vivo pela Gama FM.

Ele embarcou no meu tom enfático e vibrante e acreditou.
A coisa funcionou perfeitamente.
Ou melhor, quase.
Minha intenção era pegar todos os dados do indivíduo para entregá-los ao banco. Eu estava convencido de que se tratava do tal operador de telemarketing.

Depois do endereço, pedi o CPF.

E ele:

- Mas eu tenho 14 anos!

Percebi que estava diante de outro que não meu suspeito.
Levei a brincadeira até o fim. Ele quis saber quando o relógio seria entregue. Tudo direitinho.
Cheguei a ficar com pena. Pensei até em levar o rádio relógio pro guri.
Mas fiquei firme.
Ele aguardou o prazo que dei. Não chegou relógio algum.
Nunca mais ligou.

domingo, 28 de outubro de 2007

Coincidências


O rabino Sobel foi pego com a boca na botija, ou melhor, com as gravatas surrupiadas.
O padre Lancelotti está pra lá de enrolado com os milhares de reais ofertados a seu amigo íntimo.
O apóstolo Hernandes e a bispa Sonia estão em cana, nos Estados Unidos.
Coincidência.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Serviço de Utilidade Pública

A Polícia Federal adverte:
Tomar leite pode causar perfurações no intestino.


Sugestão: troque o leite do café da manhã por vinho tinto (de preferência português, claro, claro)

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

O Portão


Às vezes, principalmente à noite, costumo sintonizar o canal de TV que mostra a portaria do prédio em que moro. Assisto, então, a um filme fantástico, repleto de intensas metáforas.


O ritmo é lento, como convém a um filme-de-arte. Diria mesmo quase parado. O quase vai por conta dos carros que passam vez ou outra. As grades lembram nossa condição de aprisionados pelos limites impostos a nossos desejos. Os carros que passam remetem à fugacidade da existência humana. Um transeunte passa no sentido contrário dos carros. Natureza versus tecnologia. Um quase Bergman. Vez ou outra chega um entregador de pizza. É a invasão do cotidiano em minha meditação transcendental. Recomendo.

domingo, 14 de outubro de 2007

Miles de locos


Hoje me senti como o mexicano da velha piada. Pra quem não conhece, um mexicano ia pela manhã por uma auto estrada e inadvertidamente entrou na pista contrária. A rádio que dava notícias sobre o trânsito e que o dito cujo mexicano ouvia, alertou seus ouvintes:
- Usuários da auto estrada tal. Muito cuidado. Há um louco na contramão.
E o mexicano, pensando alto:
- Un loco, no. Miles de locos.

Pois a Baixinha me arrastou para assistir ao espetáculo teatral O Baile. A coisa toda é um desastre. Não, não pode ser dito assim. O certo é dizer que a peça – perdoem-me os leitores mais sensíveis – é uma bosta.

Até aí, nada. Ou quase nada. O mundo está repleto de peças teatrais horrorosas.

Minha estupefação foi quanto ao público. Primeiro: casa lotada. Segundo: o público, ao final, aplaude de pé, por longos minutos. Todo mundo sai maravilhado. Só se escutam comentários elogiosos, na saída.

Definitivamente, sou um E.T..

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Da série O Brasil acabou - VI


O presidente do Congresso Nacional – Renan Calheiros - parece querer bater o recorde mundial de apego ao cargo. Sua situação atingiu um tal grau de ridículo que já supera largamente a marca de Severino Cavalcanti no ridiculômetro.

O Executivo é comandado pelo Nove Dedos (quando eu era pequeno, havia um famoso meliante cuja alcunha era Sete Dedos. Avançamos dois dedos nos últimos 50 anos).

Um membro do STF – Gilmar Mendes – pressiona senadores para que aprovem a nomeação de apaniguado para um cargo no Dnit.

Em uma república assim, da famosa frase do Stanislaw Ponte Preta (Restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos) só nos restou o último dos termos da disjunção.

É pegar ou largar.